“O mercado que representa de 15 a 20% do PIB e 20% do
emprego no Brasil precisa ser protagonista do debate sobre
sustentabilidade”, afirma Mario Prestes Monzoni Neto, professor e
coordenador do
Centro de Estudos em Sustentabilidade (GVCes) da Escola de
Administração de Empresas
de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (FGV-EAESP). Assim como nos
demais setores, segundo ele, não há uma unanimidade de como as empresas
vêm e lidam com o tema. Mas houve uma grande evolução nos últimos dez
anos. “Muitas companhias já percebem a geração de valor e de
oportunidades relacionadas às ações sustentáveis. Mas nós ainda estamos
no início de um processo. É o começo de uma nova e o fim de uma velha
economia e elas estão coexistindo, com esquizofrenias e polaridades.”
Segundo Monzoni, para colaborar com a evolução do tema sustentabilidade no setor da
construção civil,
é necessário ter líderes desse segmento dispostos a discutir e pensar
em soluções. “Vamos construir um futuro que dê conta de olhar o meio
ambiente com respeito, olhar a população local, ao redor, e também ter
lucro. Isso é um desafio para os gestores, mas é importante e possível
achar alternativas dentro desse contexto”.
A cadeia da construção
civil
é muito ampla, envolve empresas de materiais de construção,
construtoras, projetos de hidrelétricas e entidades setoriais. “Qualquer
ação faz a diferença. As construtoras Camargo Corrêa, Odebrecht, OAS e
Andrade Gutierrez, por exemplo, acabaram de lançar, com o Instituto
Ethos, o Guia Metodológico para Inventário de Emissões de Gases de
Efeito Estufa
(GEE) na Engenharia e Construção. O que já é um avanço porque mostra
como eles estão se articulando para o uso de ferramentas sobre o
assunto. Muitas
empresas com
capital aberto também já começam a perceber que os investidores
perguntam sobre questões sustentáveis e cobram isso”, comenta o
professor.
A certificação LEED (Leadership in Energy and
Environmental Design)
é outro investimento que, em pouco tempo, toda a sociedade vai conhecer
e saber de seus benefícios. “É muito fácil, já que as questões
ambientais e econômicas andam juntas. É bom para o meio ambiente e
economicamente também é melhor”, ressalta. Para ele, em pouco tempo não
será possível operar no mercado sem esse tipo de certificação. Será
praticamente obrigatória.
Governança
Outro exemplo do progresso do setor é o estabelecimento e divulgação do conceito
green building
no Brasil. “Há alguns anos não havia a discussão sobre um investimento
inicial maior em green building em contrapartida com as consequentes
reduções de custos a longo prazo”, diz Monzoni, acrescentando que o
principal desafio está nas grandes obras. “É necessário achar o
direcionamento entre a necessidade e a infraestrutura, e ao mesmo tempo,
de respeito entre o ambiente e a população local. Às vezes, os modelos
e os incentivos que são colocados em cima da mesa fazem com que a
trombada entre essas duas questões seja bem grande. Se, por exemplo,
houver um incentivo da geração de energia a curto prazo, haverá uma
tensão do meio ambiente e da sociedade local. É complexo, mas é
necessário trabalhar a tecnologia social para se achar uma solução, e
ela existe”. E explica: “É uma proposta de longo prazo, que envolve
governança entre articulação política, instrumentos financeiros e
econômicos para apoiar atividades sustentáveis nesse território e
indicadores para monitorar esse desenvolvimento. É trazer para o âmbito
local a discussão que se dá no global, as grandes questões da Rio+20,
como Economia Verde Inclusiva, Governança entre outros temas.
É
pensar em como construir uma agenda e como ela será governada. A empresa
é um entre outros atores, e como monitorar se o caminho está certo?”,
questiona.
Referindo-se ao PAC, programa do governo federal que
representa investimentos da ordem de R$ 1 trilhão, Monzoni indaga: “E
como fazemos dentro desse novo contexto de sustentabilidade? É
possível?”. Ele entende que sim e completa: “É necessário aprender com o
passado, não cometer os mesmos erros e ter uma tecnologia social para
esse grande investimento, afinal, a indústria da construção é quem vai
ficar com grande parte dessa verba, porque é a fornecedora de todos os
empreendedores”.
Principais momentos
Criado
em 2003, os Gvces surgiu com o objetivo de inserir o tema
sustentabilidade dentro de uma escola de negócios, o que ocorreu de duas
maneiras: por meio da grade curricular e, também, explorando a relação
da escola com a comunidade empresarial, governo e políticas públicas.
“Isso pensando em uma transformação maior da sociedade, para outro tipo
de desenvolvimento”, comenta o coordenador.
“Começamos pequenos e
tínhamos uma origem mais forte do tema de sustentabilidade na indústria
financeira, já que eu vinha de um trabalho nessa área. E continuamos
trabalhando o assunto na indústria financeira e mercado de capitais”,
explica Neto. Como consequência, uma das grandes realizações dos Gvces
foi a criação, em 2005, do Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE),
junto a BM&Bovespa e a International Finance Corporation (IFC),
braço financeiro do Banco Mundial. “É uma grande conquista e marco da
história do Gvces. Temos uma contribuição muito forte nesse projeto.
Somos responsáveis pela metodologia e questionário”, comemora.
No
mesmo contexto, a participação do Gvces no Guia Exame de
Sustentabilidade, do grupo Abril, também é destaque. “O guia tem uma
exposição grande e trabalha com um universo muito maior. Para se ter
uma ideia, são cerca de 180 empresas somente este ano”, diz o professor.
De
2004 a 2011, o Gvces sediou e dirigiu o “New Ventures Brasil”, um
programa de apoio a empreendedores que buscava incorporar a
sustentabilidade em seus modelos de negócio. “Promovíamos as inovações
ambientais de pequenos e médios empresários, seja de novos materiais,
biodiversidade, manejo, orgânico etc. e apresentávamos em um Fórum de
Investidores”, diz o coordenador.
Outro tema importante para o
centro de estudos é o desenvolvimento local. “Por meio de um trabalho em
parceria com a Alcoa, empresa apoiadora da iniciativa, chamado
Indicadores de Juruti, e em conjunto com a população paraense do
município de mesmo nome – local de inserção de um grande empreendimento
de bauxita da Alcoa – conseguimos desenvolver conhecimento no tema de
desenvolvimento local, com a inserção de empresas e grandes
empreendimentos, em particular na Amazônia”, comenta Neto. Segundo ele,
há uma nova onda de grandes investimentos na Amazônia e com o trabalho
da Alcoa foi possível construir conhecimento do que seria uma inserção
responsável, com discussões e debates sobre o tema. “Chamaria isso de
uma tecnologia social que envolve não somente a gestão de impacto, mas a
construção de pactos, de articulação política e reconstrução de futuro
comum junto à sociedade”, explica.
O clima é outro assunto
relevante na história da instituição. “Somos bastante conhecidos por
meio do programa brasileiro GHG Protocol, que completa cinco anos em
2013, e visa criar uma cultura de inventário de dados de efeito estufa
no setor empresarial corporativo. O programa reúne 106 organizações –
um aumento de 450% desde o começo da iniciativa, em 2008 – dos mais
variados tamanhos e dimensões, representando 16 setores da economia
brasileira”, afirma o professor.
A questão do consumo
sustentável, tanto do setor privado quanto de compras públicas, também é
abordada pela entidade. “Hoje já virou política pública. Mas, em 2004,
quando começamos a discutir o assunto, as pessoas achavam que era
desculpa para aumentar os preços. E, atualmente, o governo federal tem
gente trabalhando com isso”, ressalta. Outra ação de importante
contribuição junto à sociedade na produção de informação e conhecimento é
a revista mensal Página 22 que já está em sua sétima edição.
Segundo
o coordenador, o tema sustentabilidade já foi bastante difundido
internamente na FGV. “Hoje já existe uma pasta dentro do lato sensu
sobre gestão de sustentabilidade. E, na graduação, há uma disciplina
que é reconhecida e sucesso de público e de crítica, que é a formação
integrada para sustentabilidade. É uma inovação na formação de alunos
na gestão empresarial e pública, porque além da aula formal, os alunos
fazem muita viagem de campo, vão para a Amazônia conhecer Belo Monte,
para o Pará ver a biodiversidade, já foram para o Mato Grosso saber mais
sobre agronegócio, entre outras”. Além de trabalhar outras janelas de
aprendizado, como Tai Chi, dança, artes etc. “Afinal, nem todo o
conhecimento entra pela maneira formal e um power point. Acredito que
essa disciplina seja algo inovador também na relação aluno e escola”,
completa.
Fonte:
http://obra24horas.com.br/materias/tecnologia-e-sustentabilidade/sustentabilidade-ganha-cada-vez-mais-relevancia-na-construcao-civil